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Nobre respira Palmeiras, diz não ter mais hobbies e revela refúgio em casa

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Até o começo de 2013, Paulo Nobre era apenas mais um entre milhares de palmeirenses. Sua vida era cheia de aventuras: pilotava carros de rali pelo mundo e, quando estava em São Paulo, dirigia o Palmeirinha, seu time de infância, que já contou até com Evair no comando do ataque. Como dissemos, essa era a vida de Nobre até o início de 2013. Depois, tudo mudou…

Assumiu o clube em situação financeira grave, precisou utilizar seu patrimônio pessoal para levantar dinheiro e foi alvo de muitas críticas em 2014, quando o alviverde quase foi rebaixado para a Série B. Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, Nobre abriu o jogo sobre seu dia a dia por trás da cadeira de mandatário palmeirense, e revelou os impactos devastadores que o cargo à frente de um grande clube tiveram em sua vida pessoal – do adeus a todos hobbies, cobranças na rua, o refúgio em casa e as saudades dos tempos de anonimato.

UOL Esporte: você assumiu o clube em uma situação difícil, precisou retornar à Série A. Em 2014 foi muito criticado enquanto priorizava resolver o problema financeiro. Como foi conviver com as criticas?

Nobre: Uma vez que você se candidata a ser presidente de clube grande, precisa estar preparado. Tem um lado de glamour, mas é a ponta do iceberg. Grande parte do trabalho as pessoas não veem, tem que ter consciência que é coisa árdua, as vezes injusta. Pode ser o melhor do mundo, se a bola pegar na trave e sair, é um desgraçado. Se pegar e entrar, é um deus. O combustível do futebol é o dinheiro, e pegamos o clube em uma situação, se fosse uma empresa, totalmente falimentar, com 25% só das receitas do ano. Trabalhamos em 2014 para ter um time competitivo, com criatividade, empréstimos gratuitos. Perdemos alguns jogadores, tivemos problemas e a auto estima que tinha sido resgatada em 2013 foi abalada. Nem no meu pior dos pesadelos imaginava passar por aquilo, mas acreditava que os frutos plantados passariam a ser colhidos. Com satisfação vejo que isso começa a ocorrer em 2015.

UOL Esporte: você acredita que agora as pessoas reconhecem isso? E no futuro, acha que pode ser visto como uma espécie de “salvador”?

Nobre: vou ser muito sincero, não faço as coisas para me glorificar. É uma coisa tão séria, Palmeiras é praticamente minha religião, é o ar que eu respiro. Como eu, tem milhões de palmeirenses. Me preparei muito, assumi em 2013 com uma missão: entregar um clube melhor do que encontrei. Consegui, me reelegi, e isso aumentou a responsabilidade, as pessoas acreditaram que era o caminho certo. Sou muito crítico com todos os que trabalham comigo, e comigo mesmo, é quase desumano o quanto me exijo. Quero olhar para trás e pensar “fiz um bom trabalho”. Estou presidente, mas sou torcedor, quero um dia voltar a ser e ver o Palmeiras me dar as alegrias que sempre me deu.

UOL Esporte: e o que você faz quando não está se dedicando ao Palmeiras?

Nobre: todos os meus hobbies, abandonei, não tem como. Correr rally de vez em quando é perigoso, precisa ter ritmo de corrida, estar vestido no carro, não é brincadeira. É um esporte onde você está sujeito a um acidente em cada curva. Jogar futebol, também me aposentei. Tenho meu time, o Palmeirinha, há 40 anos, joga toda terça, mas eu não jogo mais há uns três anos. Meu lazer? Nunca valorizei tanto na vida voltar para casa. Chego em casa, sei que não vou resolver mais nenhum problema, procuro recarregar as energias para o dia seguinte. No fim de semana o Palmeiras joga domingo, sábado é quase sagrado, quero curtir minha vida normal, brincar com cachorros, fazer um churrasco, alguma coisa simples, que nunca valorizei tanto.

UOL Esporte: você chega a se desligar do Palmeiras?

Nobre: Enquanto presidente, sou presidente 24h, quero estar ciente. No final de semana tem duas ou três pessoas que atendo de imediato. Os demais, procuro não atender, ou eventualmente falar domingo, que dia de jogo é dia de trabalho. Na hora que começa o jogo peço um pouco de refresco para ser torcedor – eu sou torcedor mesmo. Assisto ao jogo no campo, volto para casa. Arrumei uma namorada que entende isso que acontece – palmeirense, claro. Ela não só vai no campo, como assiste VT comigo, costumo assistir. Eu dou retorno para todo mundo que me liga, mas o sábado procuro manter para mim.

UOL Esporte: você é reconhecido quando sai às ruas? Já sofreu cobranças em público?

Nobre: Sempre tive a mesma atitude, não me exponho. Costumava jantar fora, cortei, vou em dois ou três lugares só para resolver negócios. Em qualquer lugar me conhecem, sou presidente de um dos maiores clubes do mundo. Uma vez, em 2013, estava sentado na frente de um restaurante, na espera, um mendigo passou, pediu dinheiro, eu disse que não tinha. Ele saiu, olhou para mim e disse “presidente mão de vaca”. Estive em Portugal também depois para tentar contratar o Alan Kardec, um português falou “tu não és presidente do Palmeiras?”. Pensei “Nossa Senhora”. Você perde completamente o anonimato, passam a te observar, comentar, e tem que aprender a conviver.

UOL Esporte: e isso chega a te incomodar?

Nobre: Incomoda um pouco, eu amava meu anonimato. No futebol vai ter bons e maus momentos, não adianta se emocionar com aplausos, nem se abater com criticas. Exemplo disso foi Boa Esporte e Palmeiras na Série B em 2013. Cheguei, fui ovacionado que nem jogador, me perguntaram a sensação, é realmente boa. O Palmeiras perdeu de 1 a 0, e a torcida que me ovacionava, quando acabou o jogo, era “Paulo Nobre isso, aquilo, contrata jogador”. Isso é normal.

UOL Esporte: é difícil separar o torcedor do presidente? Você dá palpites no futebol?

Nobre: É muito difícil separar. O torcedor é você, ele está presidente. Orientação ao time eu nunca dei, não é a minha. Falo, às vezes, como presidente, sempre consulto a comissão técnica, não posso me intrometer. Às vezes, vendo jogos, tenho atitudes de xingar, desabafar, continuo sendo torcedor. Quando o juiz comete um erro, eu me comporto como qualquer palmeirense (risos). Tento me conter porque quando dou uma entrevista, não é mais o Paulo Nobre, é o presidente da Sociedade Esportiva Palmeiras. Querendo ou não, hoje com as redes sociais, as coisas se espalham. Um conselheiro, um diretor, representa a instituição. Tomo muito cuidado. quando sinto que posso exagerar, saio do camarote, vou para o vestiário, prefiro ficar mais sozinho, porque hoje sou presidente. Em alguns jogos acontece isso, eu vou para o vestiário esfriar a cabeça.

UOL Esporte: o que costuma te irritar quando assiste aos jogos do Palmeiras?

Nobre: Certos cartões amarelos, vermelhos, acho um absurdo. Eu não falo com jogador, mas deixo claro com profissionais do futebol algumas filosofias. Não gosto que humilhe adversário – dar uma caneta para fazer um gol, tudo bem, mas só para humilhar adversário, não acho correto. Nunca admiti isso no Palmeirinha, e não acho uma coisa legal. Quem trabalha comigo sabe certas filosofias: respeito à instituição, exijo que honre a camisa. Respeito ao adversário, tem certas filosofias aqui dentro, não falo para os jogadores, mas os profissionais falam.

UOL Esporte: como palmeirense, então, você deve ter ficado irritadíssimo com o Edilson no Paulista de 99 então… (atuando pelo Corinthians, o atacante parou com a partida em andamento e fez embaixadas para provocar o rival – time que já tinha defendido).

Nobre: O Edilson deve muito ao Palmeiras, veio de um time menor e explodiu aqui. Depois, tomou atitudes que achou que deveria tomar, jogando por um rival. Como palmeirense, para mim, Edilson deixou de existir na história do Palmeiras. Sem raiva, sem nada, o comportamento acabou apagando tudo aquilo que ele fez com a camisa do clube. Não desejo o mal, só que certos comportamentos são inadmissíveis. Aqui, ele não foi legal. A gente colhe o que planta, a vida é assim.

UOL Esporte: um dos pontos mais controversos da sua gestão foi o dos mais de R$ 100 milhões de empréstimos que você repassou ao Palmeiras. Porque tomou essa decisão?

Nobre: Pensei muito antes de fazer isso, dirigente colocar dinheiro é a contramão do que penso. Fiz porque simplesmente não tinha mais outra solução. Ou fazia, ou o Palmeiras não tinha dinheiro para continuar depois de abril de 2013. Acabou tudo. Não coloquei para fazer obra, não era para contratar jogador. Era para a roda não parar – pagar luz, água, jogadores que estavam aqui, porteiro, garçom, a empresa que cuida da grama. Dia a dia do clube. Comecei a ouvir besteiras no conselho deliberativo, do tipo “jogador que dá certo é seu, que não dá é do Palmeiras”. Contratei Mendieta, Leandro do Grêmio, os argentinos que o Gareca pediu. Assumo esses seis, se forem vendidos, me devolve o principal e o lucro é 100% do Palmeiras. Não sou investidor de jogador. Se der certo, ótimo, se não, eu mico com o prejuízo.

UOL Esporte: sua condição financeira, os empréstimos e a melhora do Palmeiras geram boatos de contratações de peso, milionárias. Como você lida com isso?

Nobre: quando falaram de Hulk (atacante da seleção brasileira e do Zenit-RUS), achei muito engraçado, mas também fico preocupado com essas coisas. O torcedor vai alimentando essa expectativa, sendo que nunca teve nem conversa. Aí tem cara que fala “mas o Hulk é palmeirense”. E daí? Ele foi comprado por dezenas de milhões de euros, recebe um salário gigantesco até para os padrões europeus. Acham que por ser palmeirense o time vai liberar e ele vai querer ganhar 10% do que ganhava? Isso totalmente impossível.

UOL Esporte: você tem amizades com jogadores, ídolos no futebol?

Nobre: O futebol na minha casa, alguns jogadores já foram. A maior emoção da minha vida foi o dia que Evair jogou na minha casa. Tive três grandes ídolos: Toninho Catarina na infância, Jorginho na adolescência e, na vida adulta, Evair. Se for falar dos anos 2000, Marcão. Quando o Evair foi em casa…tenho um pôster dele que deve ter uns 4m de altura. Foi uma emoção ímpar. Gosto muito do Evair, é uma relação fã e ídolo, mas não frequentamos a casa um do outro. Tenho admiração muito grande pelo Marcos também, mas não poderia dizer que tenho amizade, de frequentar casa. Na minha casa só entra camisa do Palmeiras (risos). Existe uma regra, é terminantemente proibido qualquer artigo – shorts, meião, caneleira, luva – de qualquer time que não seja o Palmeiras ou um time estrangeiro.

UOL Esportes: e desafetos, pessoas que te decepcionaram? Alguma chance de reconciliação com Carlos Miguel Aidar, presidente do São Paulo?

Nobre: Em dois anos e meio de presidente, várias pessoas me decepcionaram, mas isso eu guardo para mim. Sobre Aidar, vamos deixar claro: São Paulo e Palmeiras estão muito, muito acima dos seus atuais mandatários. Não sou rompido com o São Paulo, sou rompido com seu presidente, para mim a atitude que ele teve não foi ética, honesta, causou a discórdia. Não existe hipótese de reconciliar. Ele não existe na minha vida, não desejo a desgraça nem nada, só ignoro a existência desse sujeito, mas respeito muito a história do São Paulo.

UOL Esporte: é verdade que sua família é de são paulinos? Como virou palmeirense?

Nobre: meu pai era torcedor do Paulistano, sempre falava do Arthur Friedenreich (considerado um dos maiores jogadores da fase amadora do futebol). Nos anos 30, o futebol se profissionalizou, o Paulistano não admitia a hipótese, o futebol ser um esporte de gentleman. Uma facção saiu e fundou o São Paulo. Meu pai não foi, era contra o profissionalismo, nunca me levou em um jogo. Meu pai gostava de hipismo, meu irmão também. Já fiz varias reflexões para entender como virei palmeirense. Creio que por causa do Emerson Leão. Na Copa de 74, tinha seis anos, admirava muito o Leão. Um marceneiro me explicou que existiam clubes, e os melhores formavam a seleção. Quis saber onde jogava o Leão, era no Palmeiras, acabei sendo palmeirense. Ou, talvez, sou palmeirense porque Deus quis. Acho que a explicação do Leão é melhor.

UOL Esporte: e a relação com as torcidas organizadas? Na sua gestão, o Palmeiras cortou privilégios delas, você sofre alguma cobrança ou represália por isso?

Nobre: a relação não é ruim, ela só não existe. O torcedor torce e faz seu papel na arquibancada, e nós trabalhamos e fazemos nosso papel atrás da mesa. Acho que cada um fazendo o seu bem feito, quem ganha com isso é Palmeiras. Não sofro pressão nenhuma, sempre tem as pessoas descontentes, aqueles que, quando tem uma grade entre você e ela, xingam. É normal, no fim é tutti palmeirense (risos).

UOL Esporte: você apoiaria alguma iniciativa diferente, como uma torcida organizada gay, algo que já aconteceu com outros clubes?

Nobre: não interfiro em absolutamente nada com relação a torcedores. Isso não é uma coisa do presidente, não tem que opinar ou deixar de opinar.

UOL Esporte: o Palmeiras, no momento, discute algumas mudanças de estatuto, dentre elas a alteração no mandato de dois para três anos. Você consideraria disputar mais uma eleição se as novas regras permitissem isso?

Nobre: Não passa pela minha cabeça nada que venha beneficiar quem está no poder. A discussão entre dois e três anos é saudável, mas não pode beneficiar quem está no poder. Vou querer lançar um sucessor, confio muito que estará totalmente preparado para dar continuidade ao trabalho, mas não admitiria mudança que aumente meu mandato, ou permita reeleição. Eu trabalharia politicamente para que não acontecesse. O Palmeiras não pode ser dependente de ninguém, de presidente, a máquina tem que continuar rodando da mesma maneira, independente do presidente. Não trabalho com essa hipótese. Não precisaria nem de mudança para tentar achar uma brechinha. Isso é tudo conversinha. Não. Tive meu primeiro mandato, tive minha reeleição, fui o primeiro a ser eleito pelo sócio e não posso ser presidente em 2017.

UOL Esporte: te preocupa a possibilidade de, daqui a anos, o Palmeiras voltar à situação na qual estava em 2013?

Nobre: Isso preocupa qualquer palmeirense. O estado que ficou é inadmissível para um time da grandeza do Palmeiras. Precisa conscientizar as pessoas com direito a voto para tomar cuidado com os populistas, que prometem tudo. “Vou tirar dinheiro não sei da onde, um fundo vai colocar tantos milhões, já tem três jogadores contratados”. Toma cuidado e vê se quem promete não é populista. Acho que o amadurecimento do eleitorado é fundamental para que pessoas comprometidas venham a ganhar as eleições no Palmeiras, e não pessoas que só querem entrar para a história do clube a qualquer custo.

Fonte: UOL

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