Palestra enfia 8 no Corinthians em tarde de Romeu

Foi um ano de felicidade, aquele 1933: 8 a 0 em cima do Corinthians em tarde de gala de Romeu Pelliciari.

É comum um técnico ser demitido após uma goleada contra um inimigo declarado, um grande rival: às vezes, acontece até mesmo de algum jogador ser dispensado. Mas, cair todos os dirigentes é algo difícil de acontecer.

Talvez essa vez tenha sido a única em toda a história do futebol brasileiro e mundial. Foi assim, depois de levar uma cacetada de 8 a 0, que a diretoria inteira do Corinthians abandonou o poder.

Para contar essa história, é preciso lembrar que até o final de 1932 o futebol brasileiro era plenamente amador. Os jogadores ganhavam por fora, com envelopes sendo entregues sorrateiramente, como se a profissão que desempenhavam fosse algo vergonhoso para a época. Afinal, jogadores não tinham que jogar por prazer?

À partir de 1933, instaurou-se o profissionalismo no Brasil. Porém alguns clubes não quiseram participar do ato e acabaram levando seus times pagando ajuda de custo, como eram chamados os salários dos atletas que resolveram não se profissionalizar.

O Campeonato da Apea, o mais importante do Estado de São Paulo, foi disputado por oito clubes: Palestra Itália, Corinthians, São Paulo da Floresta, Santos, Portuguesa, Ypiranga, São Bento e Sírio.

No primeiro turno, dia 07 de maio, o Palestra já deu mostras do que estava por vir: 5 a 1 no Corinthians, sem reclamações e desespero. Vitória com autoridade dos palestrinos, sem contestações.

Meses depois, em novembro, o Palestra enfrentaria novamente o Corinthians, desta vez no estádio Palestra Itália, na época com status de melhor local para se jogar futebol. Arquibancadas de cimento e lugar para 30 mil expectadores. E foi no dia 05 de novembro que o Palestra mostrou para os corintianos como se joga bola.

Sete minutos depois que a bola rolou, Romeu Pelliciari já mandou para o gol um belo sem pulo, abrindo o placar. Desesperado, o Corinthians não conseguia produzir e, aos 30, Romeu entrou com bola e tudo. 2 a 0. Aos 40, chute de fora da área de Romeu e mais um gol do Palestra. 3 a 0.

Na volta, os alvinegros tentaram se reorganizar. Mas logo no primeiro minuto, Gabardo fez o quarto. Aos sete minutos, Romeu mandou mais um. Dois minutos depois, Imparatto fez o sexto gol. Aos 20 minutos, o juiz anulou gol legítimo de Imparatto, que ficou revoltado. Mas, aos 35, Imparatto fez outro gol, validado pelo juiz. 7 a 0. Aos 40, Imparatto de novo: Palestra 8 x 0 Corinthians.

Com vergonha, o então presidente corintiano, Alfredo Schurig (que curiosamente dá o nome ao brejo-estádio que o Corinthians tem na bifurcação da Marginal Tietê, em São Paulo) pediu demissão do cargo. Com ele, toda diretoria abandonou o barco, deixando o comando do clube à ver navios.

Essa foi a maior goleada até então entre Palestra/Palmeiras e Corinthians. Foi uma belíssima campanha: 14 jogos, 12 vitórias, apenas uma derrota e um empate. Apenas três pontos perdidos (naquela época, a classificação era obtida com o menor número de pontos perdidos: uma derrota significava dois pontos, e um empate um ponto perdido).

Naquele ano, disputava-se também os jogos do primeiro Torneio Rio-São Paulo, criado exatamente para celebrar o profissionalismo implantado de comum acordo entre dirigentes dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo.

Os jogos dentro do próprio campeonato contavam pontos também para o Rio-São Paulo. Esse caneco também foi para o Parque Antárctica, celebrando um ano histórico do Palestra.

Ficha técnica

Palestra Itália 8 x 0 Corinthians
Campeonato Paulista e Torneio Rio-São Paulo
Data: 05 de novembro de 1933

Local: Parque Antárctica

Juiz: Haroldo Dias de Mota

Público: Sem informações

Renda: Sem informações

Palestra Itália: Nascimento; Cernera e Junqueira; Tunga, Dully e Tuffy; Avellino, Gabardo, Romeu Pellicciari, Lara e Imparatto. Técnico: Humberto Cabelli

Corinthians: Onça; Rossi e Bazani (Nascimento); Jango, Brancácio e Carlos; Carlinhos, Baianinho, Zuza, Chola e Gallet. Técnico: Pedro Mazzulo.

 

Perfil: Romeu Pellicciari

Meio baixo, meio gordo, meio careca, mas um artilheiro por inteiro. Assim era Romeu Pellicciari, um dos maiores goleadores do Palestra. Não foi por acaso que ele foi o artilheiro do time no único tricampeonato paulista conquistado até agora, em 1934, com 13 gols.

Nascido em Jundiaí-SP, em 26 de março de 1911, chegou ao clube em 1930, após ter atuado no Barranco e no São João de sua cidade. Após o tri, em 1935, se transferiu para o Fluminense, onde foi campeão mais cinco vezes. Em 1942, com o falecimento do seu pai, retornou para São Paulo para fincar seu nome na história do Verdão: ganhou o primeiro campeonato com o nome de Palmeiras. Encerrou sua carreira em 1943, atuando pelo Comercial da Capital. Foi um dos principais jogadores da Copa do Mundo de 1938, realizada na Itália. Porém, um dos seus momentos mais marcantes ocorreu em 05 de novembro de 1933, quando aplicou cinco gols na goleada de 8 a 0 do Palestra frente o Corinthians. Hábil no drible e com lançamentos precisos, criou uma jogada chamada “passo de ganso”, parecida com a atual pedalada.

Romeu era pequeno de tamanho, mas foi um dos maiores jogadores da história do Palestra/Palmeiras.