Em meio à guerra, um novo batismo

O Rio já tinha um cartão-postal, o qual, aliás, virara símbolo do Brasil: o Cristo Redentor, gigantesca imagem inaugurada em 1931. São Paulo, apesar de ser uma cidade importante, rica, de um milhão de habitantes, não tinha ainda imagens importantes que a representassem.

Na transição das décadas de 30 e 40, no entanto, os paulistanos aban­donaram a modéstia e literalmente lançaram-se para o alto. No início dos 30, dominando o vale do Anhangabaú, erguia-se o edifício Mar­tinelli, uma ousadia arquitetônica para a época, quando apenas se ensaiava o uso da expressão “arranha-céu” para nomear os prédios que pareciam então querer alcançar as nuvens. A alguns metros dele, surgia, em 1939, outro desses monumentos urbanos, o edifício Matarazzo. Feito para abrigar a sede adminis­trativa do enorme conglomerado industrial, empregou material importado de altíssima qualidade e a melhor tecnologia existente no mundo, como ocorrera no Martinelli. O Conde Francesco, seu idealizador, não viu o marco de seu sucesso pronto: morreu em 1937.

A cidade mostrava ter pressa de se expandir. Tanto que, em 1938, o prefeito Fábio Prado inaugurara o viaduto do Chá, um colosso em concreto armado ligando as praças do Patriarca e Ramos de Azevedo. O viaduto já existia desde 1892, mas não suportava mais o tráfego de bondes e veículos. Essa movimentação cul­minou em 1939, quando o Mappin decidiu saltar o viaduto, instalando-se em frente ao Teatro Municipal. São Paulo ganhara seu car­tão-postal, o complexo urbanizado do Anhan­gabaú. Os dias de elegância do “Triângulo” estavam terminados – embora a região não fosse perder a importância, pois se transfor­maria paulatinamente em centro financeiro. A cidade não se mexia apenas no centro; em outra ponta do vale do Anhangabaú, corria, desde 1935, outra obra gigantesca; o túnel 9 de Julho que iria desbravar para os arranha-céus outra região, o até então pacato Jardim Paulista.

O Palestra Itália não ficou imune à febre de modernização representada pelo cimento armado. Já em 1933 apresentara à cidade seu novo estádio, cuja construção levara dois anos. O Parque Antártica tomava então as feições que tem hoje. Depois das obras, o clube pôde expandir, em 1935, as atividades extra-esporte, criando o Departamento Social. Tais ativi­dades até então concentravam-se na sede social, que ficava no Martinelli. No novo com­plexo social-esportivo, o clube desenvolveria uma nova modalidade, o aristocrático tênis; em 1937, já estava ali o maior centro brasileiro da categoria com torneios regulares, inclusive noturnos, em quadras iluminadas, um grande avanço para a época.

Palestra Itália em 1933.
Palestra Itália em 1933.

A situação política, contudo, também mexia na vida do clube. Na Europa, França e Ingla­terra declararam guerra à Alemanha, com a qual a Itália formalizara uma aliança em 1936. A São Paulo de 1,4 milhão de habitantes (300 mil deles operários, espalhados por quatro mil fábricas), servida por 3 mil ônibus, 500 bondes elétricos, 10 estações de rádio, acompanhava de longe o conflito.

O Brasil estava neutro até 1942, quando cinco navios nacionais foram atacados por alemães. Getúlio Vargas, governando com os poderes ditato­riais do Estado Novo – que se instalar em 1937 – foi obrigado a declarar guerra ao Eixo Alemanha-Itália em agosto de 1942 (O país enviaria 25.455 soldados, os “pracinhas”, para lugar na Europa com os Aliados).

Entre os 30 mil veículos que trafegavam nas ruas paulistanas começaram a aparecer os carros a gasogênio, pois a gasolina foi racionada. Em guerra com a Alemanha e a Itália, o Brasil não podia admitir a exibição de nomes de países ligados ao eixo em firmas ou entidades. A ordem chegou às portas do Par­que Antártica em 14 de setembro de 1942, vés­pera da final do Campeonato Paulista, contra o São Paulo, em forma de ultimato. Se o Palestra não mudasse o nome não entraria em campo no dia seguinte, advertia a Diretoria de Es­portes do Estado. Em reunião de emergência realizada na mesma noite, por sugestão do conselheiro Mário Minervino, foi aprovado o novo nome do clube: Sociedade Esportiva Pal­meiras. O “novo” time da cidade conseguiu uma façanha inédita, pois “estreou” ganhando o título.